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Caxias Do Sul, Rio Grande do Sul, Brazil
Preparador Físico. Atualmente no Esporte Clube Juventude de Caxias do Sul/RS.

domingo, 23 de setembro de 2012

Periodização no futebol... É viável?

Futebol profissional apresenta algumas características em comum em todo o mundo

Francisco Adolfo Ferreira

O futebol profissional de alto rendimento apresenta algumas particularidades em comum nos cinco continentes, mais notadamente nos grandes clubes sul-americanos e europeus: elevado número de jogos, competições simultâneas, pouco tempo para preparação geral (pré-temporada) e elevada cobrança por resultados (necessidade de alto rendimento durante todo o ano), ou seja, as equipes se vêem na obrigação de entrar em todas as competições que disputam com o time em condições de brigar pelo título.

A pressão da imprensa esportiva, dos torcedores e dos próprios dirigentes é elevada e nenhuma dessas partes quer saber se há condições adequadas para uma boa preparação ou não. Por essas razões, as periodizações tradicionais: Matveyev, Verkhoshanski e outros, não têm lugar no futebol profissional como exemplificado acima. Se existe a pressão para disputar todas as competições do calendário anual em condições de ganhar o título, não haveria coerência em estabelecer metas para obtenção de um pico de performance que, como se sabe, tem duração limitada, vindo a seguir um período de decréscimo no desempenho.

É característica do futebol exigir um desempenho ótimo, não máximo, em praticamente todas as capacidades físicas. Desta forma, um modelo de periodização que consiga manter um desempenho "apenas" ótimo, mas que perdure ao longo de toda a temporada seria o mais indicado.

Alguns modelos de periodização, que têm sido utilizados de maneira mais coerente com o calendário do futebol, seriam a periodização com cargas ondulatórias (Tschiene, 1990), (Manso; Valdivielso; Caballero, 1996), o modelo de Cargas Seletivas (Gomes, 2002) e a chamada Periodização Tática, citada por Oliveira (2005), Carvalhal (2003) e Mourinho (2001). Estes modelos preconizam algumas características em comum como: período geral curto ou até mesmo inexistente, ênfase em trabalho específico, intensidade alta durante toda a temporada e volume mais ou menos constante.

Cargas Ondulatórias: Como o próprio nome diz, as cargas de treinamento são distribuídas ao longo da temporada de forma ondulatória. Alternando-se Volume e Intensidade sem baixar de 80% de seus potenciais máximos de carga, ou seja, uso contínuo de uma elevada Intensidade, utilização predominante de trabalho específico de competição, utilização de intervalos profiláticos. Como não objetiva atingir um pico de performance, mas manter um bom nível de rendimento ao longo de toda a temporada, é importante que o nível técnico da equipe seja alto e homogêneo como forma de compensar a inexistência de um índice máximo de performance.

Cargas Seletivas: Caracteriza-se por um período geral curto (como é comum no futebol brasileiro), seguido de período específico onde se prioriza a intensidade e as capacidades relacionadas à velocidade. O Volume permanece praticamente inalterado. Objetiva o rendimento sub-máximo em cada capacidade. A capacidade aeróbia, por exemplo, com exceção do período geral (pré-temporada), não necessitará ser trabalhada através do seu treinamento específico e/ou isolado, uma vez que todas as outras formas de treinamento (treinos anaeróbios, coletivos, etc.), além do próprio jogo em si, já serão suficientes para mantê-la em um nível adequado para a prática do futebol em alto nível de rendimento.

Periodização Tática: Contextualização do jogo, da equipe, dos jogadores, das competições, etc. A componente tática como ponto central da preparação; o Modelo de Jogo Adotado exige uma integração onde estarão subjugadas à dimensão táctica as restantes dimensões: Técnica, física e psicológica, as quais serão desenvolvidas "a reboque". O Princípio da Especificidade é quem dirige a Periodização Táctica. O meio de operacionalizar o Modelo de Jogo são os exercícios específicos, exercícios desenvolvidos com Intensidade em concentração, de acordo com o Modelo de Jogo Adotado e serão os meios mais eficazes para adquirir uma forte relação entre mente e hábito.

A operacionalização do treino exige a utilização de exercícios específicos desde o primeiro dia de treinamento da temporada. Impõe-se uma inversão no binômio Volume-Intensidade, a Intensidade é quem "comanda", e o Volume é o somatório de frações de máxima intensidade (Volume da qualidade) de acordo com o Modelo de Jogo Adotado. Esta periodização obriga o Princípio da Estabilização, de forma a permitir os patamares de rendimento. A Estabilização da Forma Desportiva consegue-se com base na estruturação de um determinado microciclo, onde o grau de desgaste semanal seja similar de semana para semana. A estrutura básica do microciclo deve manter-se (os momentos de treino, a duração, etc), o que leva a uma estabilização de rendimento. Faz sentido falar em forma desportiva coletiva, que está ligada ao jogar (bem) de acordo com o Modelo de Jogo Adotado. A referência que serve como indicador é: "jogar melhor". Ausência de trabalho geral e de trabalho isolado das capacidades físicas.

O trabalho dentro da especificidade desde o primeiro dia de treinamento tem como objetivo o imediato desenvolvimento do esquema de jogo da equipe, alternando as intensidades através de conceitos como: tempos, densidade, pausas, continuidade, concentração, intensidade de concentração, esta especificidade sendo o mais próximo possível da realidade de jogo.

As periodizações tradicionais seriam indicadas para equipes de pequeno ou médio porte e para categorias de base, onde a pressão por resultados e o número de competições disputadas no ano seriam, teoricamente, menores.

*Preparador Físico do Departamento de Futebol Profissional do Cruzeiro Esporte Clube
Professor da Faculdade Estácio de Sá - BH
www.cruzeiro.com.br
francisco.ferreira@clube.cruzeiro.com.br


Referências Bibliográficas

GOMES, Antônio Carlos. Treinamento desportivo: estruturação e periodização. Editora Artmed, 2002 - Porto Alegre.
OLIVEIRA, Raúl. A planificação, programação e periodização do treino em futebol: um olhar sobre a especificidade do jogo de futebol. www.efdeportes.com, Revista Digital - Año 10 - No 89 - Outubro 2005 - Buenos Aires.
 
Artigo publicado no site:

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

O FC Barcelona, o treinador José Mourinho, a Periodização Tática e os treinos analíticos: fatos e reflexões

 

Não podemos construir a base dos nossos argumentos em falsas verdades, pois eles perdem consistência

“Para quem tem como única ferramenta o martelo, todos os problemas são pregos.”
Parafraseando Mark Twain, que é o autor da frase acima, proponho nesta semana uma reflexão sobre alguns fatos que envolvem discussões (e problemas) que têm cercado o momento “metodológico” e “filosófico” do nosso (brasileiro) futebol profissional e de base.

De início, vamos aos fatos.

Fato 1: Quando começou a ganhar destaque no cenário mundial do futebol, conquistando títulos internacionais pela equipe do FC Porto, o treinador José Mourinho deu início também a uma eufórica e desenfreada série de reportagens, matérias, vídeos e livros reverenciando sua ação como treinador e os seus métodos inovadores de trabalho.
Estar ao lado dele, conhecê-lo, ser seu amigo ou mesmo ter sido seu professor em alguma etapa de sua formação acadêmica passou a ser, de alguma forma, vantajoso. Qualquer tipo de associação com a sua imagem fez aumentar o capital simbólico de publicações, pessoas e mais especificamente para a nossa discussão, de metodologias de treino.

Fato 2: Quando o Santos FC foi “atropelado” (me desculpem pelo “atropelado”) pelo FC Barcelona na partida final do Mundial de Clubes da Fifa 2011, emergiu no Brasil uma série de debates propondo nas entrelinhas (e sobre as linhas) que o “modelo” Barcelona de jogar e formar jogadores precisava, por que não, ser seguido pelas equipes brasileiras – sugerindo que os clubes no Brasil estavam (ou estão) atrasados em planejamento, conhecimento, modelos de treino, nível de profissionais, e etc.
Assim como aconteceu no caso do treinador português José Mourinho, passou a ser vantajoso para defender certos pontos de vista, utilizar o FC Barcelona como referência para justificar argumentos em uma ou em outra direção.
Pois bem.
Colocados os fatos, é bom esclarecer que não tenho intuito com esse texto de apontar verdades, mentiras, erros ou acertos, nem tampouco fazer julgamentos exatos sobre qualquer coisa.
O que desejo realmente é provocar reflexões.
Então, vamos lá.
Estive, entre 2010 e 2012, em três momentos distintos (simpósio, fórum e competição – não nesta ordem) com profissionais das categorias de base do FC Barcelona debatendo e trocando informações sobre futebol, processo formativo, meios e métodos de treinamento.
Tive acesso às planilhas do clube, assisti a vídeos de treinos e pude filmar alguns. E para os que dizem o contrário, posso afirmar: são realizados sistematicamente nos treinamentos das categorias de base do clube exercícios analíticos (fragmentados, previsíveis e centrados na técnica).
E que relação tem isso com o “fato 2” mencionado acima?
Muitos de nós, na justa ânsia de romper com paradigmas impregnados no nosso “brasileiro futebol” e expandir as fronteiras do conhecimento – em prol da disseminação de uma ideia de Complexidade – acabamos muitas vezes por associarmos nossas ideias àquilo que seria feito nas categorias de formação do time catalão (naquilo que, nos nossos sonhos, justificaria a avassaladora aula de futebol dada por eles na final do Mundial de Clubes).
Essa associação justificou muitas vezes a não utilização de atividades analíticas de treino. Mas, como, se o FC Barcelona se utiliza desse tipo de atividade em seus treinamentos?
Não estou defendendo os exercícios analíticos. O que estou sugerindo é a análise crítica dos fatos, e acima de tudo da Complexidade.
Não podemos aceitar os argumentos a favor de uma ou outra metodologia de treino, contrária a atividades analíticas, utilizando o FC Barcelona como referência dessa não utilização.
Continuemos.
Da mesma maneira que argumentos são associados ao FC Barcelona para dar valor a certas ideias, muitas e muitas vezes, foi e continua sendo vinculada à forma de trabalhar do treinador português José Mourinho a metodologia portuguesa (concebida pelo professor Vitor Frade) de concepção dos treinamentos chamada “Periodização Tática”.
Ainda que tenha grande valor, será mesmo que Mourinho se utiliza da Periodização Tática para planejar e construir seus treinos?
Por muito tempo os portugueses vêm dizendo que sim. E isso tem aumentado cada vez mais o simbolismo da Periodização Tática.
Estive com Rui Faria (adjunto do treinador português) em uma visita ao centro de treinamento do Real Madrid, por ocasião de uma viagem a Espanha, e em uma conversa informal, pude perguntar sobre o seu trabalho com Mourinho e sobre a relação desse trabalho com aquilo que foi “batizado” de Periodização Tática (tema que o próprio Rui debateu em trabalho acadêmico no passado).
Objetivamente, ele apontou para o fato de que não aplicavam a “Periodização Tática” de Vitor Frade, mas sim, uma periodização que também levava em conta a ação tática do jogador dentro do planejamento geral.
Disse que o jogo de José Mourinho é um jogo muito maior do que aquele de dentro do gramado, e que afirmar que eles (Mourinho e sua comissão técnica) trabalhavam e alcançavam sucesso a partir da Periodização Tática seria uma redução demasiada da qualidade e complexidade do trabalho que realizavam.
Não estou criticando a Periodização Tática; especialmente porque ela é um marco na história metodológica do treinamento dentro do futebol – ainda que apresente lacunas em nome da própria Complexidade que defende. O que estou sugerindo mais uma vez é a observação crítica dos fatos.
Não podemos construir a base dos nossos argumentos em falsas verdades (ou no desconhecimento dos fatos reais) – porque assim eles perdem consistência. E não estou aqui dizendo que sou eu o conhecedor dos fatos reais.
Reforço novamente que o que desejo é propor reflexões.
Citando Bruno Pivetti, “sabemos que no futebol existem muitas verdades e mentiras, que há possibilidade de o certo resultar em errado, e de o errado transfigurar-se em correto” (livro “Periodização Tática”, que recomendo).
E será isso obra do acaso, ou resultado da nossa incapacidade de compreender a ordem dentro do Caos?
Por que não avançarmos e tentarmos perceber, de posse de um martelo como única ferramenta, outros problemas, que não sejam somente pregos – dando ao martelo outra utilidade?
Por que não sustentarmos e apoiarmos nossos argumentos na essência das coisas, e que, certos ou errados, não precisemos fazer associações incorretas para aumentar o capital simbólico deles?
Tem um martelo? Então, qual o seu problema?

Prof Rodrigo Leitão

Artigo publicado no site: http://www.universidadedofutebol.com.br/Colunas/2012/08/3,11917,O+FC+BARCELONA++O+TREINADOR+JOSE+MOURINHO++A+PERIODIZACAO+TATICA+E+OS+TREINOS+ANALITICOS+FATOS+E+REF.aspx

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Preparação física e treinamento tático

Preparação física e treinamento tático
Aperfeiçoando o rendimento esportivo
Wladimir Braga
O futebol, como esporte coletivo, durante muitos anos utilizou os conhecimentos do atletismo como ferramenta de aprimoramento do componente físico. A concepção de treinamento deste esporte fragmentou-se em setores distintos como treinamento tático, técnico, físico, psicológico dentre outros. Havia um corpo multidisciplinar, mas não uma relação interdisciplinar.

Ainda hoje, existe esta forma de pensamento (por alguns profissionais) em que cada área faz a sua parte para o rendimento atlético aparecer. Os modelos propostos de periodização, também, não se aplicam à estrutura permanente do calendário de jogos. Enfim, o componente tático, com isso, fica prejudicado justamente por investir muito tempo com atividades sem fundamento prático e sem eficácia para a performance total de uma equipe.

José Mourinho, em "Por que Tantas Vitórias", colocou em xeque este conceito de trabalho acabando com o chamado "pico de rendimento", segundo ele inexistente no futebol. No livro Fisiologia do Esporte e Exercício, dos autores Wilmore e Costill, consta que "as adaptações fisiológicas em resposta ao treinamento físico são altamente específicas à natureza da atividade do treinamento, além disso, quanto mais específico for o programa de treinamento em determinado esporte ou atividade, maior a melhora do desempenho nesse esporte ou atividade".

Neste sentido, estas considerações sugerem que o perfil dos profissionais que atuam na função de técnico e preparador físico seja revisto. O rendimento tático deve ser visto como a síntese de todo o trabalho, deste modo, cada membro da comissão passa a atuar num mesmo contexto permitindo maior eficácia no trabalho.

Para deixar as coisas mais claras, devemos questionar qual a real função de cada método utilizado para o aprimoramento das capacidades físicas, qual a utilidade de separarmos o físico do tático sendo que o rendimento pretendido é no jogo. E ainda, devemos questionar se no futebol existe período preparatório com esse calendário de jogos. Para responder cada uma destas perguntas não é preciso de uma avaliação física, mas sim de uma avaliação profissional e ainda pessoal.

Será que o preparador é o único responsável pela performance física ou será que a eficiência tática determina este rendimento?!

Com isso os chamados treinos funcionais tornam não instrumentos principais e sim auxiliares para o desempenho, o treinamento tático, então, passa a orientar a carga de treinamento. O preparador físico, neste nível, se identifica como um pedagogo ou um motricista do esporte ajudando na estrutura tática global, trabalhando sobre a execução de funções e manobras mais específicas ou individuais sem (importante esclarecer) esquecer os conceitos e as capacidades envolvidas em cada exercício controlando volume e intensidade de treino.

Este conceito de treino sugeriu ser um equívoco separar o treino tático do físico, mas de forma alguma aboliu os treinos funcionais, que sem dúvida podem fazer parte do programa de treino (principalmente o treino de força que será abordado posteriormente). Na verdade, esta proposta defende que é melhor executar exercícios em forma de jogo do que corridas contínuas ou intervaladas para a aquisição de resistência, por exemplo. A avaliação, portanto, é mais qualitativa do que quantitativa, pois é a assimilação do modelo de jogo proposto que interessa e a adaptação física, vai ocorrer especificamente à atividade realizada dentro da estrutura tática proposta pela comissão técnica.

O desafio passa a ser como organizar toda a estrutura de treinamento planejando as etapas a serem seguidas pela comissão considerando todos os itens referentes ao rendimento da equipe. Se considerarmos, por exemplo, três aspectos físicos: resistência, força e velocidade, e todos os objetivos táticos a serem alcançados como podemos organizar os conteúdos de trabalho?

Destina-se a cada comissão técnica estabelecer suas metas e caminho para atingi-las. O mais importante nesta jornada é nunca perder de foco o modelo de jogo e assim organizar cada treinamento de acordo como ele. Não esquecer, assim, que cada parte forma um modelo único.

Não existe, portanto, uma receita única para a obtenção do sucesso, pois a cada momento novas informações surgem para contribuir com esta modalidade, mas o questionamento das ações acaba sendo um comportamento exigido para a obtenção da excelência do desporto competitivo. O amadurecimento a cada ano de trabalho é o maior prêmio para que segue esta atitude.

Com isso, é de extrema importância que os modelos de treinamento sejam alvo de mais discussão e que uma abordagem partindo de uma perspectiva mais ampla se torne um novo caminho para os profissionais de hoje.
 
Bibliografia
MOURINHO, José. Por que tantas vitórias? Oliveira, Amieiro, Resende, Barreto-Gradiva, 2006
Wilmore & Costill. Fisiologia do esporte e do exercício. Editora Manole, 2001
 
Material retirado do site:
 

sábado, 2 de junho de 2012

A especificidade na aplicação do treino para futebolistas: a quebra de paradigmas e a necessidade de mudanças rápidas na forma de aplicação de treinos

Se não for específico, não é do esporte. Independente se a carga aplicada for geral, específica ou especial, deve ser voltada para a realidade imposta dentro da competição

Sandro Sargentim*

Nas últimas décadas muito se discute e se estuda sobre como avaliar, treinar e qualificar os treinos dos futebolistas. As análises são todas válidas, pois através delas, podemos saber com precisão como que o atleta de futebol se desloca, e de que forma, com qual intensidade, essa ação motora ocorre.

Um detalhe, contudo, é geralmente esquecido nas linhas de pesquisas e especialmente na sua aplicação prática: a especificidade dos treinos para atletas de futebol.

É comum observarmos clubes estruturados, com diversos profissionais de alto nível, compondo os departamentos médico, fisiológico e nutricional, aplicando treinamentos retrógrados e defasados com métodos inespecíficos para o movimento do futebolista em campo, tais como corrida longa contínua ou intervalada, treinos em caixas de areia ou na praia, e exercícios de musculação com aparelhos, em especial em cadeia cinética aberta.

As análises do volume e da intensidade do deslocamento do futebolista em um jogo são simples de ser entendidos e assimilados.

Os estudos recentes demonstram que, apesar do atleta de futebol se deslocar mais que 9 km em um jogo, a fase ativa da partida, onde de fato o atleta atua e decide o jogo de futebol (Sargentim, 2010), é disputada em uma metragem inferior a 1,5 Km, sob alta intensidade (Di Salvo e cols., 2007).

O futebolista permanece andando, caminhando, ou trotando sob leve intensidade cerca de 80 a 85% do jogo (Bangsbo, 2006). Nessa fase, a fase passiva, é o momento em que os futebolistas atuam sim no jogo de futebol, mas não decidem ofensiva e defensivamente o jogo. Nesse momento os atletas se recuperam dos estímulos fortes, intensos, dinâmicos e especialmente ultracurtos que compõem a fase ativa de futebol.

Os gestos específicos do futebolista são intensos e curtos não ultrapassando 4 segundos de execução (Helgerud e cols., 2001). Para cada ação motora de alta ou altíssima intensidade, o atleta de futebol recupera em uma partida em média 90 segundos (Hoff, J e Helgerud, 2004).

Ao analisar e compreender esses dados através dos estudos científicos coletados em jogos oficiais de primeiro escalão do futebol mundial, o questionamento aparece: Como ainda é possível profissionais que atuam aplicando treino no futebol, aplicarem treinos sem a menor transferência para as características do desporto?

O futebolista acelera em distâncias máximas de 20 metros em um jogo de futebol (Gatz, 2009), contudo a maior parte dos gestos realizados em aceleração não ultrapassa 10 metros em linha reta. As ações em velocidade na maior parte das vezes acontecem de forma acíclica, com mudança de direção, se caracterizando por desacelerações e novas acelerações na mesma ação.

Com esses dados em mãos podemos pontuar que os gestos específicos dos futebolistas em campo são caracterizados por uma reação rápida e curta com a mudança de direção, novamente potencializando a necessidade da reação rápida dos componentes neuromusculares dos futebolistas.

Esses gestos rápidos de aceleração e desaceleração são produtos da otimização das derivações da força explosiva, conhecido como um fenômeno natural definido como ciclo alongamento-encurtamento, que tem como regra básica a troca instantânea e precisa da ação excêntrica para concêntrica, também conhecida como pliometria (Komi, 2006).

Essa resposta transitória intensa, rápida e precisa, é caracterizada como a principal característica para a velocidade de reação e das respostas rápidas, essenciais para futebolistas.

Portanto, com base nesse panorama, como é possível pensarmos que times de futebol ainda se preocupam em correr em linha reta de forma cíclica contínua ou intervalada, se o jogo de futebol é caracterizado por acelerações curtas, desacelerações e gestos específicos com alta intensidade e curtas durações, com um período longo de recuperação?

Nesse caso poderei exemplificar a citação bem humorada, mais pertinente feita por Vitor Frade citada no livro do Bruno Pivetti “Para se tocar o piano, ninguém visualiza o pianista correndo em volta do referido instrumento musical para adquirir resistência no intuito de produzir belas melodias” (Pivetti, 2012).

Para elaborarmos um treino, independente do desporto, precisamos antes de focarmos em sobrecarga, individualidade biológica, parâmetros de avaliação física, entre outros igualmente importantes, o objetivo central e primordial deve ser elaborar treinos específicos para cada modalidade.

O futebol é um esporte e deve ser treinado seguindo princípios básicos e essências do treinamento desportivo. Não podemos aplicar treinos seguindo intuições ou padrões pré-definidos de acordo com experiências anteriores especialmente copiando treinos realizados nas décadas passadas.

Tudo evolui, desde a tecnologia, medicina, meios de transporte, comunicação, entre tantos. Os meios de aplicação dos treinos devem seguir sempre um processo de evolução e atualização, desde que siga critérios bem definidos e pautados dentro de diretrizes voltadas para cada área especifica.

Nesse caso não quero pontuar quem está certo nem errado. Longe disso. O objetivo dessa discussão é esclarecer uma atualização dentro do processo de treinamento específico no futebol.

O treinamento desportivo é pautado sob alguns princípios os quais se destacam a especificidade, a individualidade biológica e a sobrecarga.

Não é possível definirmos qual princípio do treinamento é o mais importante em relação ao outro, todos têm sua importância igualitária, e se completam de forma interdependente. Contudo antes de individualizarmos o treino e definirmos uma sobrecarga ideal, um fator é essencial para pontuarmos de forma exata nossa aplicação dos meios de treinamento.

O princípio da especificidade vem ao encontro dessa necessidade de simular os exercícios de acordo com a realidade e as demandas de cada modalidade. Isso não é novidade, há muitas décadas atrás Verkhoshanski já dizia “ deve se treinar como se joga e se compete…” (Verkhoshanski,1996).

Os meios e métodos de treino devem seguir rigidamente as diretrizes e especificações de cada desporto, de acordo suas particularidades e características.

A proximidade e similaridade das sessões de treinamento com as situações específicas recorrentes ao jogo de futebol é o ponto chave do princípio da especificidade.

Se não for específico, não é do esporte. Independente se a carga aplicada for geral, específica ou especial, deve ser voltada para a realidade imposta dentro da competição.

A especificidade esta relacionada diretamente com o padrão e a intensidade dos exercícios relacionados ao movimento específico do desporto. Contudo, um detalhe essencial esta relacionado ao direcionamento e o respeito a esse princípio: o piso que se aplica o treino e o calçado que o atleta executa a ação.

O atleta de futebol atua no gramado, vestindo chuteiras. Essa é a regra básica para a aplicação de treinamentos relacionados às atividades específicas do futebolista.

Treinos em parques, pistas de atletismo, campos de golfe, praia, caixa de areia ferem o princípio básico e essencial do treinamento desportivo, o princípio da especificidade.

Quanto maior a similaridade mecânica, maior o grau de transferência. Para buscar um gesto motor relacionado os movimentos intensos e curtos recorrentes do jogo de futebol, aliados aos aspectos técnicos do jogo, ações inerentes ao treino devem ser direcionadas dentro do campo de jogo com os atletas vestindo chuteiras.

Os treinos em outros pisos como parques, areia, quadras, devem ser relacionados com outros desportos, específicos para o esporte escolhido. Contudo para aprimoramento da condição física e técnica do futebolista, de forma específica, o treino deve ser ministrado dentro do terreno de jogo, com o material igual ou parecido com o utilizado na competição.

Corridas em areia são específicas para esportes que são disputados na areia, ações motoras em quadras são específicas para esportes que competem em ginásio, e assim por diante.

Os treinos realizados em piso pouco denso, como a areia, agem negativamente dentro dos componentes neuro-musculares, aumentando a ação excêntrica e diminuindo a fase de transição entre os dois tipos de ação muscular excêntrico para o concêntrico.

O treino em caixa de areia diminui o componente elástico da musculatura do futebolista, ou seja, proporciona ao atleta de futebol, uma perda da velocidade de reação e das suas respostas imediatas.

O futebolista nunca vai treinar especificamente em caixa de areia, ou realizando corridas longas. O treino de resistência deve ser realizado com treinos específicos com a bola, em campos reduzidos, treinos em velocidade, entre tantos, sempre em alta intensidade, com períodos de recuperação

O treino específico para futebolistas sempre deve ser realizado no gramado, com os atletas vestindo chuteiras e realizando os movimentos parecidos com os executados nos jogos de futebol. Invertendo com isso uma ordem até então universal no futebol que era a aplicação do treino com volumes altos e intensidade baixa.

Atualmente para o ganho de resistência específica do futebolista, o treino dever ter o caráter dinâmico e curto, com alta intensidade e períodos curtos de recuperação, aliado a um volume baixo, para produzir respostas positivas no organismo do atleta de acordo com a imposição requerida no jogo de futebol.

O principio da especificidade deve ser aplicado em todos os períodos do ano, desde os primeiros treinos no período preparatório geral, até os últimos treinos do período competitivo.

O treinamento físico dentro do futebol brasileiro cada dia mais ganha espaço, e com isso a responsabilidade dos profissionais que aplicam treino aumenta. A aplicação de treinos específicos durante toda a temporada de treinamentos, não é apenas importante, é uma obrigação dos profissionais da preparação física no futebol.

*Sandro Sargentim é preparador físico de futebol e autor do livro "Treinamento de força no futebol". Além disso, é docente no curso de pós graduação em Treinamento Desportivo - UNiFmu/Gama Filho e Treinamento Funcional - Ceafi e coordenador da pós graduação em Ciências no Futebol - UniFmu.

Bibliografia

Bangsbo, J; Mohr, M; Krustrup, P. Physical and metabolic demands of training and match-play inthe elite footbal player. Journal Sports Science, v.24, p. 665-74, 2006.

Di Salvo et al. Performance characteristics according to playing position in elite soccer. International Journal of Sports Medicine, v.28, n.3, p.222-7, 2007.

Gatz, G. Complete conditioning for soccer. Human Kinetics, 2009, p.197.

Helgerud, J.; Engen, L.C.; Wisloff, U.; Hoff, J. Aerobic endurance training improves soccer performance. Medicine Science Exercise. V.33, p.1925-1931, 2001.

Hoff, J.; Helgerud, J. Endurance and strength training for soccer players. Physiological Considerations. Sports Medicine; v.34, n.3, p.165-180, 2004.

Komi, P. V. Força e potência no esporte. Porto Alegre: Artmed, 2006. p.530.

Pivetti, B.M.F. Periodização Tática. O futebol arte alicerçado em critérios. São Paulo: Phorte. 2012. p. 296.

Sargentim, S.: Treinamento de força no futebol. São Paulo: Phorte. 2010. p.120.

Verkhoshanski, I. Força- Treinamento da potência muscular. Londrina, CID, 1996.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Volumes e Intensidades dos Deslocamentos de Jogadores de Futebol

Deslocamentos no 1º tempo
Variáveis Atletas
    1     2     3     4     5     6     7
Distância total (m) 5.376 5.283 5.659 5.262 5.596 4.906 5.259
Distância em velocidade baixa 2.190 2.307 1.811 2.207 2.175 2.494 2.189
Distância em velocidade média 2.763 2.623 3.414 2.641 3.096 1.807 2.779
Distância em velocidade alta 423 353 434 414 325 605 291
Deslocamentos no 2º tempo
Variáveis Atletas
    1     2     3     4     5     6     7
Distância total (m) 4.346 4.799 5.242 4.970 5.400 4.487 4.988
Distância em velocidade baixa 2.229 2.171 2.028 2.013 2.313 2.279 2.280
Distância em velocidade média 1.889 2.442 2.688 2.624 2.649 1.659 2.420
Distância em velocidade alta 228 186 526 333 438 549 288
Corrida velocidade baixa: ± 2,8m/s ou 10,08 km/h
Corrida velocidade média: ± 5,4m/s ou 19,44 km/h
Corrida velocidade alta: ± 7,4m/s ou 26,64 km/h

GOMES, A.C.; SOUZA, J. Futebol: Treinamento Desportivo de Alto Rendimento. Artmed. Porto Alegre, 2008.




Distância percorrida por jogadores de futebol: 8 a 14 km/partida.
Jogadores de elite brasileiros: 10 a 11 km/partida.

% de distância percorrida na partida por posição tática
Posições
Andando (%)
Deslocamento Lateral (%)
Trote (%)
Corrida (%)
Sprint (%)
Defensores
23,7
8,9
45
14,5
7,9
Meio campistas
21,9
7,8
49,9
15,1
5,3
Atacantes
29,8
10,1
44,4
10
5,8
RIENZI et al, 2000; VAN GOOL, VAN GERVEN e BOUTMANS, 1988; OHASHI et al, 1988; BANGSBO, 1992; BANGSBO, 2006, WITHERS et al, 1982; DI SALVO et al, 2007; ANANIAS et al, 1998; HELGERUD et al, 2001; THATCHER e BATTERHAM, 2004; apud ARRUDA E HEPANHOL, 2009.

domingo, 18 de março de 2012

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Dica de Treino

Procure sempre elaborar os treinos de seu atleta ou sua equipe, seguindo uma sequência pedagógica dos substratos energéticos.
Por exemplo, se sua equipe treina 2 períodos por dia a sequência seria a seguinte:

SegundaTerçaQuartaQuintaSextaSábadoDomingo
ManhãATP-CPAeróbioATP-CPAeróbioATP-CPAeróbioOFF
TardeGlicolíticoOFFGlicolíticoOFFGlicolíticoOFFOFF

Bons treinos!

Estágios do Mecanismo de Contração Muscular

1º Estágio: O influxo de CA2+ para o citosol promove sua união a troponina, promovendo uma alteração na tropomiosina e expondo os sítios ativos de ligação da actina.
2º Estágio: Ligação da actina à miosina.
3º Estágio: A hidrólise do ATP e a saída sequencial de PI e ADP do sítio de ligação, provoca o deslizamento do filamento fino.
4º Estágio: A ligação de uma molécula de ATP à miosina resulta no seu desligamento do filamento de actina.
5º Estágio: A hidrólise desse ATP leva à reenergização e reposição da ponte cruzada.
6º Estágio: A hidrólise de ATP pelas bombas de CA2+ leva os íons CA2+ novamente para dentro do retículo sarcoplasmático.
Para um melhor entendimento veja os vídeos sobre contração muscular partes 1, 2, 3 e 4 na página de treinamento.
Ide, B. N.; Lopes, C.R.; Sarraipa, M. F. Fisiologia do Treinamento Esportivo: treinamento de força, potência, velocidade e resistência, periodização e habilidades psicológicas no treinamento esportivo. Phorte. São Paulo. 2010.